Lula é ‘mais do que inocente’ e vítima de perseguição judicial, diz advogado

O ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da “lava jato” atuaram de forma ilegal e direcionada para condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com as decisões do Supremo Tribunal Federal de reconhecer a suspeição de Moro e declarar a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, o petista voltou a ser “mais do que inocente”. Isso porque o STF apontou que ele foi vítima de uma perseguição judicial.

É o que afirma o advogado e cientista político Fernando Augusto Fernandes, que teve uma segunda edição, revista e atualizada, de seu livro Geopolítica da intervenção — a verdadeira história da “lava jato”, publicado originalmente em 2020, lançada pela Geração Editorial.

Moro condenou Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá (SP). Com a confirmação da sentença pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (PR, SC e RS), o petista foi preso e impedido de participar das eleições de 2018. Depois, ele foi condenado pelos mesmos delitos no processo do sítio de Atibaia (SP), pela juíza Gabriela Hardt, substituta de Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba.

No ano passado, quando o Supremo declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba e a suspeição de Moro, as condenações de Lula foram anuladas. O petista, então, recuperou todos os seus direitos políticos, tornando-se novamente elegível. Graças a isso, ele agora é candidato a um terceiro mandato.

Mesmo assim, lavajatistas como Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol continuam dizendo que “o STF não inocentou Lula”. No entanto, Fernando Fernandes disse à revista eletrônica Consultor Jurídico que Lula “é mais do que inocente”.

“O Supremo reconheceu que Lula foi perseguido por um juiz parcial e listou inúmeros atos de perseguição, como a condução coercitiva, e de atuação política, como a juntada e divulgação da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci por Moro em um processo em que não havia mais possibilidade disso, em momento eleitoral, e a divulgação da gravação de Lula com Dilma Rousseff, que foi feita depois do prazo de autorização judicial, com fins específicos”, disse o criminalista. “A Vaza Jato trouxe os diálogos de Moro com Dallagnol e os demais procuradores. Tudo indicando realmente uma atuação ilegal e direcionada.”

O advogado também rebate a alegação de lavajatistas de que o Supremo anulou as condenações de Lula mesmo tendo sido ele condenado em três instâncias — 13ª Vara Federal de Curitiba, 8ª Turma do TRF-4 e 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

“É evidente que quem colhe as provas e julga é o juiz de primeira instancia. O tribunal trabalha com o que o juiz produziu. Portanto, dizer que o TRF-4 julgou é uma falácia. O livro aponta os elementos de envolvimento do TRF-4 na farsa Moro. E também do relator do STJ, o recém-aposentado ministro Felix Fisher. O TRF-4, por exemplo, condenou Lula dizendo que nenhum ato estava vinculado a contratos da Petrobras e que ele seria responsável por todos os atos de corrupção do governo. Lula nem era mais presidente e não ocupava nenhum cargo para ser considerado funcionário público — requisito para ser acusado de corrupção. Ou seja, toda essa história contada no livro mostra que Lula é mais do que inocente”.

Na obra, Fernando Fernandes conta os meandros “de toda a perseguição que Lula sofreu, do impedimento de ir ao enterro do irmão, do sofrimento no enterro do neto, com pessoas desamaldas comemorando”.

O advogado ressalta como o ministro do STF Gilmar Mendes apoiou a “lava jato” no começo, inclusive impedindo Lula de assumir o Ministério da Casa Civil no fim do governo Dilma. Depois, porém, Gilmar “acaba se sensibilizando e compreendendo a perseguição, os abusos, as torturas e as atuações políticas da ‘lava jato'”. Segundo ele, o momento simbólico dessa mudança ocorreu no enterro do neto de Lula, quando o ministro prestou condolências ao ex-presidente.

A nova edição de Geopolítica da intervenção — a verdadeira história da “lava jato” relata como o Supremo passou a frear abusos da “lava jato”, culminando na anulação das condenações de Lula. Foi uma grande vitória para a defesa do ex-presidente, comandada pelos advogados Cristiano Zanin Martins, Valeska Martins e Roberto Teixeira, segundo Fernandes. Ele também destaca o papel de criminalistas na representação do petista, como José Roberto Batochio, Nilo Batista e Juarez Cirino.

Vários advogados, professores e juristas contribuíram para a construção das decisões do STF, diz Fernandes. Ele menciona a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro Carol Proner, que organizou obras como Comentários a uma sentença anunciada — o processo Lula; o jurista Lenio Streck, autor da ação em que o Supremo declarou que só é possível executar a pena após o trânsito em julgado da condenação; e o Grupo Prerrogativas, que impulsionou debates sobre os abusos da “lava jato” na imprensa.

Fernando Fernandes — em conjunto com os petistas Paulo Pimenta (deputado federal pelo Rio Grande do Sul), Paulo Teixeira (deputado federal por São Paulo) e Wadih Damous (ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro) — foi autor do Habeas Corpus com o qual o ex-presidente obteve soltura em 2018, em decisão do desembargador Rogério Favreto. Porém, Sergio Moro afirmou que o magistrado não tinha competência para tomar essa decisão e se recusou a cumprir a ordem, mesmo estando de férias. O então presidente do TRF-4, Thompson Flores, deu a palavra final sobre o imbróglio e mandou que o petista continuasse detido. A atuação de Moro no episódio foi um dos fundamentos para o STF declarar sua parcialidade para julgar Lula.

O advogado também foi responsável pela reclamação no Supremo que permitiu a toda a imprensa entrevistar Lula na prisão. Além disso, defendeu o diretor do Instituto Lula Paulo Okamotto em processos da “lava jato”, como o caso do tríplex no Guarujá.

Legado de autoritarismo

“A ‘lava jato’ deixa no Judiciário um grave problema a ser resolvido, de autoritarismo, de acentuar a falta de direito de defesa e de atuação política de juízes e membros do Ministério Público”, afirma Fernandes. Em sua visão, é uma questão-chave para a democracia brasileira.

“O império americano, competente em sua dominação e manipulação, formulou a ‘doutrina de segurança nacional’, que influenciou os militares brasileiros em uma guerra imaginária contra um inimigo interno inexistente, comunista, subversivo. Com a mesma lógica, passou a se utilizar de sua influência para, gradativamente, mudar o inimigo comunista para o traficante e ampliar a influência sobre os militares, as nossas polícias, e, em seguida, os nossos juízes e promotores para o risco de um novo inimigo interno, o corrupto. Mais grave é que a influência ‘intelectual’ é tamanha que nossos conterrâneos passam a se enxergar como país de corruptos”, afirma o advogado no livro.

Por influência dos EUA, o Brasil editou normas que foram fundamentais para a “lava jato”, como a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/1998) e a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013), que regulamentou a colaboração premiada. Para Fernandes, todas essas medidas estão sendo julgadas pelo povo nas eleições.

O advogado defende que se discuta a reforma da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/ 2010). A norma estabelece que quem for condenado por órgão colegiado fica inelegível.

“O verdadeiro juiz político deve ser o voto. Se o Judiciário condena alguém por crime, deve o povo votar se confia ou não no sujeito. Ou corremos o risco de conferir o poder de controlar a eleição a três pessoas de um tribunal ligadas a interesses políticos, como ocorreu no passado.”

Publicado originalmente em: https://www.conjur.com.br/2022-set-30/lula-inocente-vitima-perseguicao-advogado

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