Matéria publicada no Conjur com a participação do advogado e pesquisador Fernando Augusto Fernandes
Devido à inépcia da inicial e à ausência de justa causa, a 12ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal rejeitou uma denúncia contra o ex-presidente Michel Temer e outros 11 réus por suposto peculato e lavagem de dinheiro em negócios envolvendo a usina nuclear Angra 3.
O Ministério Público Federal alegava que, entre 2012 e 2016, Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear (subsidiária da Eletrobras), teria desviado R$ 10,8 milhões da estatal, por meio de transferências para a empresa de engenharia AF Consult, subcontratada para obras da usina.
Os desvios teriam ocorrido por determinação de Temer, então vice-presidente da República, que seria o destinatário do dinheiro, junto ao seu amigo e operador financeiro João Baptista Lima Filho, o coronel Lima — tudo segundo a narrativa do MPF.
As transferências teriam sido mascaradas por meio de contratos fictícios de prestação de serviços firmados pela empresa de Lima e sua esposa, Maria Rita Fratezi, com a construtora Construbase, administrada por Vanderlei Natale.
Narrativa infundada
O juiz Marcus Vinícius Reis Bastos considerou que a denúncia seria ampla, genérica e incapaz de “delimitar os contornos do fato típico”, pois não apontava todas as circunstâncias.
O MPF não descreveu como Othon teria se apropriado do dinheiro, nem como e quando tais valores teriam chegado às mãos de Temer. De acordo com o magistrado, a peça acusatória “imputa aos denunciados condutas desprovidas de elementos mínimos que lhe deem verossimilhança”.
Para Bastos, a denúncia seria baseada exclusivamente na delação de José Antunes Sobrinho, sócio da empreiteira Engevix, “sem especificar tempo, local e modo de agir”.
Além disso, conforme os dados da inicial, a lavagem de dinheiro teria excedido o montante desviado em cerca de 40%. O MPF não teria apontado qualquer explicação de como o valor lavado (R$ 14,5 milhões) seria muito maior do que o apropriado. Por fim, pela própria denúncia, o dinheiro teria sido lavado até janeiro de 2016, apesar de desviado até agosto do mesmo ano.
O MPF ainda acusava Othon e suas filhas Ana Cristina da Silva Toniolo e Ana Luiza Barbosa da Silva Bolognani de ocultarem cerca de R$ 60 milhões em contas na Suíça.
A manutenção dos depósitos no exterior teria ocorrido até o fim de 2014. Como Othon tem mais de 70 anos, o prazo de prescrição é reduzido pela metade. Assim, passados mais de seis anos, foi declarada extinta a punibilidade do réu.
Quanto às filhas, o juiz observou que eram indicadas como meras beneficiárias da maioria das contas, “circunstância insuficiente à imputação da autoria delitiva pela manutenção de depósitos”. No mais, não haveria prova de que os depósitos “não foram declarados à repartição federal competente”.
Além de Temer, Othon, Lima, Fratezi, Natale, Sobrinho, Toniolo e Bolognani, a decisão também beneficiou o empresário Carlos Alberto Costa, sócio, junto a Lima, de uma empresa de arquitetura; seu filho, Carlos Alberto Costa Filho, diretor da empresa; Carlos Alberto Montenegro Gallo, administrador de uma empresa de consultoria; e Carlos Jorge Zimmermann, representante da AF Consult.
“O tempo faz justiça ao almirante Othon. A decisão é um passo fundamental do reconhecimento às perseguições sofridas. O linchamento do lavajatismo passou e é hora do devido processo legal”, comentou o advogado de Othon, Fernando Augusto Fernandes.
Eduardo Pizarro Carnelós, advogado de Temer, também festejou a senteça. “A decisão do juiz federal Marcus Vinicius Reis Bastos pôs fim a mais uma acusação inepta e desfundamentada feita contra o ex-presidente Michel Temer, e por isso é uma homenagem ao Direito”, disse ele. “Trata-se da segunda denúncia lançada pelo MPF do RJ, com base unicamente em delação, que também foi o único fundamento para as agressões perpetradas contra Temer em 2019. A primeira daquelas denúncias já havia sido rejeitada, por decisão que foi mantida pelo TRF-1. Não há dúvida de que, no futuro, as ações promovidas contra o ex-presidente Temer estarão inscritas nos livros de História como exemplos de abjetas violações aos mais comezinhos direitos assegurados pela Constituição da República”.
Por sua vez, Maurício Silva Leite, Alexandre Sinigallia e Paola Forzenigo, advogados de João Batista Lima, afirmaram que “a decisão judicial rejeitou a ilegal tentativa de iniciar processo sem a existência de elementos mínimos para tanto. A acusação que dá início ao processo penal não pode ser fruto de ilações ou ‘achismos’ do acusador, considerando o pesado fardo que o réu carrega ao responder a uma ação penal”.
O advogado Carlos Kauffmann, outro que atuou no processo, também comemorou a decisão. “Decisões como esta restabelecem a credibilidade no Judiciário, pois ainda há juízes que examinam, com atenção, a prova dos autos.”
As acusações contra Temer têm derretido no Judiciário, quase sempre por inépcia na denúncia. Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região rejeitou uma denúncia semelhante, também relacionada a Angra 3, contra muitos dos mesmos réus.
Em fevereiro, o juiz da 12ª Vara Federal também rejeitou outra denúncia “genérica” contra Temer e outros réus. Em março de 2021, Bastos absolveu Temer sumariamente de acusação de corrupção para edição do Decreto dos Portos, já que a denúncia também não trouxe nenhuma prova.
Clique aqui para ler a decisão
1033908-16.2021.4.01.3400
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